cecilia bartoli

id="BLOGGER_PHOTO_ID_5612065345579805826" />No cenário da ópera, são poucas as vozes verdadeiramente reconhecíveis. Luciano Pavarotti era uma delas. Cecilia Bartoli é outra. A mezzo-soprano italiana é a grande cantora rossiniana e mozartiana do momento. O seu admirável virtuosismo triunfou também na ópera barroca, sobretudo em Vivaldi e Haendel. A sua interpretação de ‘La Cenerentola’ de Rossini é considerada como um dos clássicos modernos da ópera. Ao longo de mais de duas décadas, Cecília permaneceu como uma referência da música erudita. Por todo o mundo, os seus novos desempenhos, os seus programas de concerto e suas gravações, exclusivas da editora Decca, são aguardados com expectativas. Depois de lançados são excepcionais os números de vendidos, numerosos são os discos de ouro e também são numerosas as premiações: quatro Grammys (EUA), sete Echos e um Bambi (Alemanha), dois Classical Brit Awards (Reino Unidio), Victoire de la Musique (França) e muitos outros. Cecília aproxima a música erudita do grande público e contribui para a redescoberta de compositores negligenciados e repertório esquecido.

Maestros como Herbert von Karajan, Daniel Barenboim e Nikolaus Harnoncourt notaram o grande talento de Cecília assim que ela concluiu os estudos de canto com os pais em Roma, sua cidade natal. Desde então, Cecília tem trabalhado com grandes maestros, pianistas e orquestras de instrumentos de época e canta nas principais salas de concerto da Europa, dos EUA e do Japão e nos mais prestigiados palcos de ópera e festivais. Para além do reconhecimento popular e da crítica, Cecília coleciona inúmeras distinções institucionais, tais como o grau de ‘Cavalieri’, atribuído pelo governo italiano ou o título de ‘Chevalier des Arts et des Lettres’, pelo governo francês. E foi nomeada ‘accademico effettivo’ da ‘Academia de Santa Cecília’ de Roma e membro honorário da ‘Royal Academy of Music’ de Londres.

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Nascida em 1966, Cecilia Bartoli herdou dos pais, Silvana Bazzonni e Angelo Bartoli, intérpretes líricos, o interesse pelo bel canto. E os estudos no Conservatório de Santa Cecilia fizeram dela uma das vozes mais expressivas e poderosas. Mais do que isso, o repertório é escolhido através de sua incansável pesquisa e os projetos orientados por um tema. Ela transforma cada CD em projeto de marketing. Por isso é o maior best-seller de discos clássicos do planeta. Em ‘Maria’, um tributo à célebre soprano Maria Malibran, além de gravar as suas árias montou um trailer que percorreu a Europa e deixou-se fotografar com roupas e adereços da lendária cantora. Transformou ‘Sacrificium’, CD dedicado aos ‘castrati’, em algo atualíssimo. Nele, ela gravou, pela primeira vez, 11 árias de compositores italianos desconhecidos. São árias mais complexas e difíceis para a voz feminina. Tinha tudo para dar errado. Mas Cecília, nas entrevistas enfatizava sempre a atualidade do sofrimento dos 'castrati'. Nápoles era uma fábrica de ‘castratis’, castrava anualmente 4 mil crianças e fornecia andróginos sopranos e contraltos para as cortes de toda a Europa. E Cecília Bartoli foi capaz de enfrentar este repertório impossível de ser cantado por uma mulher. Um mês antes do lançamento, ‘Sacrificium’ já era um dos dez mais vendidos do site Amazon. Cecilia Bartoli é uma artista genial capaz de produzir música de altíssima qualidade.

cecilia bartoli - usignolo sventurato


Em ‘Maria’, Cecília Bartoli evoca Maria Malibran, uma das maiores cantoras da história. Tendo falecido com apenas 28 anos por consequências de uma queda de cavalo, e não deixando nenhum registro sonoro tornou-se um mito e seu nome resisti ao passar dos séculos. É um daqueles seres que a humanidade não se resigna a esquecer, como se expressou o escritor e poeta Jorge Luis Borges em uma nota musical. Era considerada também uma atriz particularmente convincente e emocionante nos palcos e dona de uma personalidade magnética que atraía a platéia onde cantasse. Sobre sua atuação no palco e presença, a novelista George Sand disse após vê-la: ‘Ela me fez chorar, estremecer - em uma palavra, sofrer -, como se eu tivesse testemunhado uma cena da vida real. Essa mulher é o principal gênio da Europa, tão bonita quanto uma das Virgens de Rafael, simples, vigorosa e sem afetações’. O mito em torno de Maria Malibran também deriva de seus múltiplos talentos e grande energia, além da sua personalidade intrigante e forte, beleza e comportamento incomum para a época, o que aumentou a sua aura de lenda da ópera.

id="BLOGGER_PHOTO_ID_5612037558552951922" />Maria Malibran, nascida María Felicia García Sitches foi uma cantora lírica (mezzosoprano) francesa, mas de ascendência espanhola, que se tornou a diva mais famosa, ainda atualmente, da primeira metade do século XIX e pertencia à talentosa família musical dos García, da qual fez parte a também célebre cantora, e sua irmã, Pauline Viardot-García. Maria Malibran cantou uma protagonista de ópera pela primeira vez aos 17 anos, em 1825, em Londres, como Rosina de ‘O Barbeiro de Sevilha’, substituindo outra célebre cantora da época, Giuditta Pasta. Durante sua curta carreira, cantou e se radicou freqüentemente na Inglaterra. Apesar dos vários elogios de compositores e artistas da época, alguns a acusavam de não ter classe e refinamento e de tentar agradar às massas que não têm gosto artístico nenhum.

Em 2007, a mezzosoprano italiana Cecilia Bartoli lançou o álbum intitulado 'Maria', em homenagem à também mezzosoprano franco-espanhola, iniciando também uma turnê em vários locais do mundo acompanhada de um museu móvel com pertences de Maria Malibran e informações sobre ela, o que atraiu nova atenção para essa legendária diva. Em ‘Maria’ encontram-se algumas das peças interpretadas durante o período de 1825 a 1936 por Maria Malibran em Londres, casos de ‘La Sonnambula’ de Bellinni, ‘Air à La Tirolienne avec Variations’ de Hummel, uma versão de ‘Infelice’ de Mendelssohn ou, ainda, ‘La Figlia Dell'aria’, de El Poeta Calculista, apelido do famosíssimo tenor e professor Manuel Garcia, pai de Maria Malibran, conhecido pela dureza com que comandou o aprendizado de canto da filha. Maria Malibran é recordada por Cecilia Bartoli, acompanhada pela Orchestra La Scintilla, dirigida por Adam Fisher.

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Maria (2006)

Tracklist
01. Irene: Se un mio desir...Cedi al duol
02. Irene: Ira del ciel
03. Ines de Castro: Cari Giorni
04. Infelice, Op. 94
05. El poeta calculista: Yo que soy contrabandista
06. La sonnambula: Ah! Non credea mirarti
07. La sonnambula: Ah! Non giunge
08. Air à la tirolienne, Op. 118
09. La figlia dell'aria: E non lo vedo...Son Regina
10. Rataplan
11. Tancredi: Dopo tante e tante pene
12. I Puritani: O Rendetemi la speme...Qui la voce
13. I Puritani: Vien, diletto
14. L'éclair: Come dolce a me favelli
15. Amelia: Scorrete, o lagrime
16. L'elisir d'amore: Prendi, per me sei libero
17. Norma: Casta diva

‘Opera Proibita’ é um projeto que traz canções religiosas proibidas para mulheres. Cecilia Bartoli cantando repertório pouco conhecido da época barroca faz-se acompanhar por uma orquestra de câmara que utiliza instrumentos de época, ‘Les Musiciens du Louvre’ de Grenoble, fundada em 1982 pelo fagotista e temível maestro Marc Minkowski e considerada como uma das melhores da música barroca e clássica na França. Em ‘Opera Proibita’, Cecília incluiu árias de Alessandro Scarlatti, Antonio Caldara e George Frideric Händel, do século XVIII, época em que a Santa Sé proibiu qualquer representação de óperas em Roma devido à sua suposta promoção de comportamento lascivo e libidinoso na sociedade italiana. Contudo, esse gênero era apresentado em salões para a audiência de príncipes e cardeais, sob a forma de oratórios, uma grande composição musical, que como na ópera, incluía orquestra, coro e solistas, mas sem qualquer interação entre os personagens, e sem adereços e trajes. Os oratórios tornaram-se populares e a principal escolha para o público da ópera. Outra característica desta época era a proibição, também pela Santa Sé, das mulheres atuarem em palco, sendo substituídas pelos ‘castrati’.

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Cecilia Bartoli Cecilia Bartoli acompanhada por ‘Les Musiciens du Louvre’

Foi esse período, de truculência religiosa na sua cidade natal, que Cecília enaltece neste disco. As árias são estupendas como em ‘Un Pensiero Nemico di Pace’, escrita por um jovem Händel, então com dezenove anos de idade, ‘All’arme Sì Accesi Guerrieri’, de Alessandro Scarlatti, considerado o pai da escola napolitana de ópera, ou ‘Sì Piangete Pupille Dolenti’, de Antonio Caldara, compositor de óperas, cantatas e oratórios, e importante influência, raramente reconhecida, em Haydn e Mozart. O ponto de ‘Opera Proibita’ é a paixão, a paixão reprimida pela proibição da performance teatral em Roma. E os compositores eram obrigados a encontrar nos oratórios a intensidade operática e a música soa mais secular do que sagrada. Embora Cecília não seja considerada uma especialista, em ‘Opera Proibita’ ela encontrou um lugar como intérprete da música antiga. Com uma mistura de piedade e drama sua voz interage com os oboés em sintonia. Ouvir ‘Opera Proibita’ é imensamente gratificante para qualquer ouvinte que aprecia a voz humana como instrumento.

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Opera Proibita (2005)

Tracklist
01. Alessandro Scarlatti - All’arme si accesi guerrieri
02. Alessandro Scarlatti - Mentre io godo
03. Georg Friedrich Haendel - Un pensiero nemico di pace
04. Antonio Caldara - Vanne pentita a piangere
05. Antonio Caldara - Sparga il senso lascivo veleno
06. Alessandro Scarlatti - Caldo Sangue
07. Georg Friedrich Haendel - Come nembo che fugge col vento
08. Alessandro Scarlatti - Ecco negl’orti tuoi...Che dolce simpatia
09. Alessandro Scarlatti - Qui resta...L’alta Roma
10. Georg Friedrich Haendel - Lascia la spina cogli la rosa
11. Alessandro Scarlatti – Ahi! qual cordoglio...Doppio affetto
12. Antonio Caldara - Si piangete pupille dolente
13. Antonio Caldara - Ahi quanto cieco...Come foco allo splendore
14. Georg Friedrich Haendel - Disserratevi oh porte d’Averno
15. Georg Friedrich Haendel - Notte funesta...Ferma l’ali

‘Sacrificium’ é um disco dedicado ao repertório dos ‘castrati’, cantores que sofriam mutilação para que sua voz se conservasse aguda. Os ‘castrati’ representam um episódio lamentável da história da música e mais uma da Igreja. A palavra designa os cantores que, na infância, tinham os testículos removidos. Para que? Para que não ocorressem as mudanças hormonais que tornam a voz grossa. Por quê? Os ‘castrati’ eram destinados aos corais das igrejas católicas devido às interdições religiosas que impediam as mulheres de cantar. O auge dessa prática ignóbil se deu na Itália, na segunda metade do século XVIII. Nas óperas, os ‘castrati’ desempenhavam tanto personagens masculinos quanto femininos. Os notáveis da música barroca valeram-se desses cantores. Nicola Porpora (1686-1768), professor de Haydn, um dos mais importantes compositores do período clássico, foi instrutor de ‘castrati’, dono de uma fábrica de máquinas cantantes. O alemão George Handel (1685-1759) escreveu o papel-título de sua ópera Giulio Cesare para o castrato Senesino. Em 1870, a igreja católica proibiu a castração para fins artísticos, e oito anos depois o papa Leão XIII baniu os ‘castrati’ dos coros das igrejas, embora Alessandro Moreschi, tido como o último castrato, tenha permanecido no coro da Capela Sistina até 1913.

O repertório desses cantores de potência única foi revisado por uma mulher, Cecilia Bartoli. ‘Sacrificium’ é inteiramente dedicado aos ‘castrati’. Uma história estarrecedora. Boa parte dos castrati é originária de Nápoles, no sul da Itália, e segundo estimativas, nesse tempo, mutilavam-se 4.000 meninos por ano. Os meninos vinham da rua ou de famílias muito pobres e eram enviados para conservatórios mantidos pela Igreja, nos quais tinham aulas de canto, música e literatura. O mais famoso entre os castrati foi Carlo Broschi (1705-1782), também conhecido como Farinelli (leia mais...). Aluno de Porpora, cantou para monarcas como Luís XV, da França, e Felipe V, da Espanha. O rei espanhol, aliás, recorreu aos serviços de Farinelli para tratar sua depressão crônica. O castrato cantou para Felipe todas as noites, durante dez anos. Mas foram poucos os que chegaram às cortes. Um cantor competente poderia arranjar emprego nos corais de igreja e nas casas de ópera da Europa. Muitos, porém, não vingavam na carreira musical e acabavam ganhando a vida na prostituição. Exagero ou não, a cantora vê alguns paralelos desse tipo de sacrifício no século XX. Compara a mutilação dos ‘castrati’ às fábricas atuais de modelos anoréxicas e também lembra Michael Jackson, uma vítima de si mesmo. Mutilou a sua pele, e com todas as plásticas desfigurou o seu rosto.

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Cecilia Bartoli acompanhada pelo grupo ‘Il Giardino Armonico’ em ‘Sacrificium’

A voz de um castrato combinava versatilidade e potência e os compositores do período exploraram essas possibilidades em peças que apresentam dificuldades para uma cantora. Cecilia sabe das suas limitações, sabe que não tem uma grande voz, mas uma voz maravilhosa, que usa com sabedoria. Jamais cantaria uma ópera de Wagner, porque sabe que não tem tanto alcance, ela mesma reconhece. No entanto, é perfeita nos desafios do repertório dos ‘castrati’, como se pode constatar nas árias ‘Cadrò, Ma Qual Si Mira’, de Francesco Araia, ou ‘Usignolo Sventurato’, de Porpora, na qual ela imita o canto de um rouxinol. O projeto ‘Sacrificium’ nasceu durante as gravações de um dos últimos discos da cantora, ‘Opera Proibita’, que trazia canções religiosas proibidas para mulheres. Cecilia resolveu pesquisar a vida dos jovens castrados que interpretavam essas peças. Segundo a meio-soprano, foi chocante saber do sofrimento desses meninos e encontrar forças para interpretar essas canções. A edição de luxo de ‘Sacrificium’ vem acompanhada de um CD-bônus e de um livro com a biografia dos principais ‘castrati’. Quando lançado pela gravadora Decca nos Estados Unidos e na Europa, ‘Sacrificium’ teve milhares de cópias vendidas. Um êxito inimaginável para os pobres mutilados do século XVIII. (fonte: Revista Veja)

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Sacrificium (2009)
CD 1    CD 2

Tracklist CD 1
01. Come nave in mezzo all'onde [Siface] from Act II of Siface
02. Profezie, di me diceste [Sedecia] from Sedecia
03. Cadrò, ma qual si mira [Demetrio] from Berenice
04. Parto, ti lascio, o cara [Arminio] from Act II of Germanico in Germania
05. Usignolo sventurato [Siface] from Act II of Siface
06. Misero pargoletto [Timante] from Act III of Demofoonte
07. In braccio a mille furie [Mirteo] from Act III of Semiramide riconosciuta
08. Qual farfalla [Decio] from Act II of Zenobia in Palmira
09. Nobil onda [Adelaide] from Adelaide
10. Deh, tu bel Dio d'amore...Ov`è il mio bene? [Farnaspe] from Act II of Adriano in Siria
11. Chi temea Giove regnant [Berenice] from Farnac
12. Quel buon pastor son io [Abel] from Act I of La Morte d'Abel

Tracklist CD 2
01. Son qual nave [Arbace] from Act III of Artaserse (Pasticcio)
02. Ombra mai fu [Serse] from Act I of Serse
03. Sposa, non mi conosci [Epitide] from Act III of Merope

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publicado por mara* às 07:21 | link do post | comentar | ver comentários (7)